17.2.07

Para-quedas //-raios

Agora tudo parece rondar a navalha da realidade.
E se me dessem a navalha na mao eu cortava de tanta raiva que eu sentia da notícia.
Gritei mas não me ouvi. O medo é maior.
Viajo para ajudar minha mãe no tratamento. Estou sendo testada com lucidez.
A realidade não deixa meus sentidos dopar nada.
Quando voltar tentarei ser diferente sem deixar o medo de sofrer falar.

estou entrando no vale das decisões, o lugar entre canyons de possibilidades. Preciso de um paraquedas e/ou de um para-raio.

7.2.07

Fome e gratuidade de um personagem que não sei.

1. O quadro:
Uma princesa vestida de gala, tem a perna esticada sobre a mesa de jantar onde tem comida, em parte, recolhida. As meias brancas estão do avesso no chão próximo a sua cadeira, uma sobre a outra, parecendo duas formas animadas se abraçando longamente. O chão está limpo, apesar de farelos. Restos. O outro pé da princesa está encostado no chão, a virilha aberta é coberta pelo vestido. Escora a coluna no encosto da cadeira de madeira escura e maciça. Seus braços estão ambos dobrados acompanhando a forma que seu corpo toma, como se contornasse a quebra da cintura entre os peitos. O pescoço não está relaxado, parece encaixado com breves movimentos que respondiam ao seus pensamentos. Olhos abertos e ausentes, como dois pontos cúmplices e inofensivos na festa que todos faziam.

Ela se mantinha assim, personagem integrado a figura do incômodo provocado por toda lucidez de festa, e fitava pontos de tramas complexas em suas luvas. A princesa usava duas luvas meio-braço, brancas rendadas, fazendo conjunto com as meias. Outros movimentos da cabeça também respondiam ao que vinha como claustrofóbica angustia imaginando momentos perdidos e potenciais com chance de serem importantes. E com esta imaginação, ela se entreteria.

Olhá-la de costas, fazia-se notar um cabelo naturalmente sadio e despenteado. A princesa, derramada na cadeira forte e levemente afastada da mesa, era sustentada por aquele objeto que parecia trata-la com carinho e servidão, como um bom cão em repouso. Vista de frente, os peitos cresciam com a respiração, mas não sugeriam saltar aos olhos. A provocação era o grau que se dispunha de pernas abertas à comida, ou ao que restara dela à mesa.

Por completar a imagem mais próxima de pós-êxtase, ninguém a movia tampouco ela mesma. Ouvia atentamente, mas nada soava mais histérico que a imaginação da perda. Do que poderia ter sido. Enquanto isso, ela fitava a mesa, com as sobras, manchas e sujeira. Restos de comida, das possibilidades e de si mesma.

Á mesa farta, com a princesa, chegam convidados. Convidados estão nitidamente desconfortáveis com a apatia da princesa, e puxam conversa que aos poucos se estabelece entre os convidados sem que a princesa participe. Surge, entre eles, frases como:
_ E você o que tem feito?
_ É verdade, está sumido(a). Por onde anda?
_ Trabalhando bastante.
_ Namorando?.
_ Ah! Você sabe quem casou?
_ Sua prima?
_ Não tenho notícias desse pessoal.
_ Sem novidades.
...
Durante a conversa, as pessoas começam a beliscar as comidas até que se sintam a vontade para encherem o prato entre silêncios, barulhos de mesa e acidentes, como derrubar o copo, os molhos e deixar cair comida do prato. Olhares para relógio e celulares indicam evidente impaciência. Surgem frases como:
_ Estou num ritmo acelerado.
_ Eu também. Preciso acordar cedo amanhã...
_ Onde você mora?
_ Ah! Você pode me dar uma carona?
_ Pra que lado você vai?
_ Adorei a comida. Já vou indo...
As pessoas começam a dispersar e deixar a mesa.
A princesa, de gala, sentada com a perna estirada na mesa e outra no chão testemunha todas as cenas, público e espaço. Garçons chegam para recolher os restos de comida e traz outras travessas com arroz, feijão, salada e água. Afastam as cadeiras indicando assento livre ao público próximo e se retiram. Ao mesmo tempo, uma tela dá início a projeção de um noticiário de TV que começa com vinheta e um âncora anunciando notícias atuais com respectivas imagens e sons acumulativos umas sobre as outras até ficar ilegível.
A princesa apática não responde à invasão da mesa. E de repente, um blackout. A princesa sai da mesa com rapidez e chega os primeiros convidados, em coro, com um bolo de aniversário e velas acesas referentes ao dia deste acontecimento. Todos cantam Parabéns pra Você para o dia da semana que estão. Fazem festa, cumprimentam e perguntam a todos na mesa quantos anos estão fazendo – estes naturalmente reagem com estranheza. Os primeiros convidados pedem a data de nascimento e traçam conversa com frases do tipo:
_ Quantos aninhos?
_ Seu dia, mês e ano?
_ Nasci dia x do mês x de 19x e hoje faço x anos e x dias. de vida.
_ Você?
_ Pareço mais nova?
_Seu dia, mês e ano?
_ Fez um pedido?
_ Ah! Escolhe o quadrante do bolo. Conhece essa brincadeira?
_Parabéns!!...

Todos fazem as contas de aniversário com calculadora ou sem, e contam há quanto tempo eles estão vivos e comemoram a idade naquele dia, quando todos fazem aniversário.

6.2.07

arma do amor

O celular tocou de manhã e ele disse eu te amo.
Enquanto me espreguiçava, deitada no chão.
Ele, na minha frente.